15 de abril de 2014

Encerramento de curso/turma por falta de alunos: possibilidade!

A questão da legalidade do encerramento de um curso ou de uma turma diante do número mínimo de alunos que o frequentam é importantíssimo para diversas instituições de ensino, inclusive, faculdades, escolas de cursos livres, e até mesmo escolas de ensino médio e fundamental. A questão precisa ser pontuada, como abaixo, se verifica. 

Tal como previsto pelo artigo 207 da Constituição Federal de 1988, as instituições de ensino gozam, por direito, de autonomia didático científica e de gestão financeira e patrimonial. Assim, podemos então afirmar, categoricamente, que a manutenção, ou não, de uma determinada turma e/ou curso por ela ofertado quando este é frequentado por um número insignificante de alunos configura-se ato unilateral decorrente dessa autonomia gerencial do próprio negócio quando precedida de alguns cuidados a serem a seguir elencados, não sendo dada procedência aos eventuais pleitos de danos morais eventualmente requeridos pelos alunos afetados, nessas situações.

Em verdade, a relação estabelecida entre aluno e instituição de ensino, embora pautada numa expectativa de sequencia dos estudos ali ministrados, perfaz-se anualmente e/ou semestralmente, conforme bem dispõe as condições norteadoras do curso em questão, as quais devem, necessariamente, serem firmadas em instrumento contratual próprio.

Assim, caso haja cláusula contratual expressa nesse instrumento regulador da relação havida entre aluno X instituição permitindo a esta última a possibilidade de não composição, para o próximo ano e/ou semestre, da turma até então existente, caso não fosse atingido o número mínimo de alunos necessários à manutenção da mesma, tem-se que a instituição poderia assim agir, desde que esse “número mínimo” fosse prévia e formalmente indicado e, na eventualidade de ocorrência dessa hipótese, fossem os alunos remanescentes amparados através de convênio a ser firmado pela instituição que encerra suas atividades e uma outra, que os receba em curso e turma similares, aproveitando todo o ensino já adquirido até então por estes mesmos alunos.

Essa é, inclusive, a inteligência do todo discutido pela apelação julgada, recentemente, pelo TJSP (processo n.º 0051356-25.2009.8.26.0000, proveniente da Comarca de São Paulo, SP), cuja ementa abaixo segue:

Indenização. Danos morais. Prestação de serviços educacionais. Encerramento de curso em virtude da insuficiência de alunos matriculados. Prerrogativa do estabelecimento de ensino prevista contratualmente. Ré que firmou convênio com outra instituição garantindo condições especiais para a transferência dos alunos matriculados no curso extinto. Ausência de ato ilícito apto a gerar indenização por dano moral. Ação julgada improcedente. Sentença mantida. Recurso improvido.

Temos, diante do todo supracitado, que tal estipulação contratual não é abusiva, eis que, como invocado, ela encontra amparo no ordenamento jurídico pátrio.

E para que não paire dúvida nenhuma acerca dessa legalidade de ação por parte das instituições de ensino (desde que respeitadas (1) a previsão dessa ocorrência no contrato norteador de tal relação, e (2) prestado o auxílio/encaminhamento dos alunos remanescentes desse curso encerrado para outra instituição a ser conveniada e que os receba aproveitando todo o aprendizado até então a eles ofertado), ressaltamos, na íntegra, o posicionamento adotado pelo eminente Desembargador Nelson Jorge Júnior, por ocasião do julgamento da Apelação n.º 0086027-74.2009.8.26.0000, tendo ele assim consignado que:

“... o fechamento do curso no final do semestre letivo por ausência de número mínimo de alunos que viabilize a sua manutenção é ato discricionário da instituição de ensino, que, segundo o artigo 207 da Constituição Federal, goza de 'autonomia didático-científica e de gestão financeira e patrimonial'. Além disso, cumpre salientar que de acordo com o artigo 53 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que regulamenta a citada autonomia das universidades, prevê em seu inciso I, a atribuição de extinguir cursos de educação superior.
Assim, estando expresso no instrumento contratual, bem como previsto em Lei Federal que regula as instituições de ensino no país, verifica-se que a extinção do curso pela ré se deu em exercício regular de seu direito. E essa cláusula contratual não enseja intelecção no sentido dela estar a descumprir os direitos do consumidor, porquanto o encerramento se deu pelo número reduzido de alunos, o que inviabilizou a continuidade, ou seja, razões de ordem econômica e financeira impossibilitou aquele prosseguimento e, portanto, não se trata de ato abusivo ou propaganda enganosa. Logo, havendo amparo na lei para que o instituto de educação pudesse encerrar aquela classe de ensino, não há que se cogitar na existência de prejuízo material ou moral, visto ter sido praticado ato lícito” (TJSP - 17ª Câm. Dir. Priv. - j. 20/03/2013).

Cumpre ainda observar em ambos os casos acima relacionados que a instituição de ensino encerrou os cursos por ela até então disponibilizados pelo acentuado déficit financeiro ali havido, o que certamente não ocorreria se houvesse o número mínimo de alunos, sendo certo que, até então, os serviços foram efetivamente prestados, cabendo observar que, mesmo diante do encerramento do curso, tais instituições não abandonaram os alunos à própria sorte, mas firmaram convênios com instituições conceituadas e similares, garantindo condições especiais para seus egressos.

Assim sendo, não há como se reconhecer a prática de ato ilícito capaz de gerar dano moral indenizável, posto que foi facultado à recorrente a transferência para outro estabelecimento de ensino, com aproveitamento das matérias estudadas.

Ocorre que para caracterizar o dano moral não basta a existência de qualquer contrariedade, dissabor ou incômodo, sendo necessária a existência de dano grave a direito de personalidade, dano este que deve estar relacionado a um comportamento ilícito de outrem. Caso contrário, não se cogita da responsabilidade prevista no artigo 186 do Código Civil.

Esta é, inclusive, a posição adotada pelo Tribunal de Justiça de são Paulo acerca do assunto, como abaixo se percebe:

“APELAÇÃO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS – Descontinuidade do curso em razão da insuficiência de alunos - Aplicação do artigo 53 da Lei n. 9.394/96 - NÃO CONFIGURAÇÃO DO ILÍCITO - AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS A ENSEJAR A REPARAÇÃO DE DANOS - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito - O autor não se desincumbiu do ônus de demonstrar fato constitutivo do seu direito - Não restou demonstrado que a conduta por parte da ré tenha causado sofrimento passível de indenização - Danos não demonstrados - Inteligência do artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil e do artigo 186 do Código Civil - Sentença mantida - Recurso improvido” (TJSP - Apelação n° 9151665-32.2008.8.26.0000 - Rel. Des. LUIS FERNANDO NISHI 32ª Câm. Dir. Priv. - j. 12/04/2012).

Veja que efetivamente uma assessoria e consultoria adequada pode tornar o gerenciamento das instituições de ensino mais seguro e efetivo, garantindo que decisões gerenciais possam ser adotadas com o menor risco possível, expondo de maneira minimizada a instituição e seus interesses.

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