22 de maio de 2014

A não incidência do recolhimento para o INSS sobre o 'aviso prévio indenizado'

Uma questão da área trabalhista que está sempre sendo questionada por Instituições de Ensino no momento de dispensar um professor ou funcionário é a incidência (ou não) de INSS sobre o aviso prévio indenizado.
O assunto possui grande repercussão no mundo jurídico e empresarial, razão pela qual possui decisões em praticamente todos os tribunais (STJ, TST, TRF’s, TRT’s etc.) e em todos os sentidos, seja a favor seja contrária a incidência do INSS sobre o aviso prévio.
Podemos destacar decisões recentes do Tribunal Superior do Trabalho decidindo pela não incidência de contribuição previdenciária sobre o aviso prévio indenizado, dentre elas destacamos as proferidas no julgamento dos Recursos de Revista n.º 107100-40.2008.5.15.0018 e n.º 1199-15.2011.5.06.0023, bem como tomamos a liberdade transcrever a que abaixo segue:
“RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA.
PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO EMBARGADO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 11.496/2007. RECURSO DE REVISTA.
CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. INCIDÊNCIA SOBRE AVISO PRÉVIO INDENIZADO. - A decisão encontra-se em perfeita sintonia com a jurisprudência do TST, no sentido de que, mesmo após a alteração do artigo 28, § 9º, e, da Lei nº 8.212/91 pela Lei nº 9.528/97, que deixou de excluir expressamente o aviso prévio indenizado da base de cálculo do salário-de-contribuição, não há como se cogitar de incidência das contribuições previdenciárias sobre aquela parcela, em razão de sua inequívoca natureza indenizatória. Recurso não conhecido - (E-RR-1193/2005-312-06-00, SDI-1, Rel. Min. Horácio Senna Pires, DJ 09.5.2008). Recurso de embargos não-conhecido” (TST - E-RR - 707/2005-161-06-00.4, Relatora Ministra Rosa Maria Weber, DJ 16/10/2009).
O Superior Tribunal de Justiça sobre o tema também se posicionou no sentido de que não há incidência de contribuição previdenciária sobre o aviso prévio indenizado, como se vê:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. EMPRESA. ART. 22, INC. I, DA LEI N. 8.212/91. BASE DE CÁLCULO. VERBA SALARIAL. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO INCIDÊNCIA. DÉCIMO-TERCEIRO SALÁRIO (GRATIFICAÇÃO NATALINA). PREVISÃO EXPRESSA. ART. 28, § 7º, DA LEI N. 8.212/91. INCIDÊNCIA.
(...) 2. Não incide contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de aviso prévio indenizado, por não se tratar de verba salarial. Precedente: REsp n. 1198964/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 2.9.2010, à unanimidade. (...)
(REsp 812.871/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/10/2010, DJe 25/10/2010)
 Na mesma linha o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, responsável pelo estado de São Paulo, também se posicionou:
AGRAVOS LEGAIS EM APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ARTIGO 557 DO CPC. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE AUXÍLIO-DOENÇA. TERÇO CONSTITUCIONAL. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. AUXÍLIO-CRECHE. SALÁRIO-FAMÍLIA. HORAS EXTRAS. ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE, DE PERICULOSIDADE E NOTURNO. SALÁRIO-MATERNIDADE. ARTIGO 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO PROVIMENTO.
(...) 5. A verba recebida de aviso prévio indenizado não possui natureza salarial, considerando que não há contraprestação em razão do serviço prestado e sim o recebimento de verba a título de indenização pela rescisão do contrato. 6. A revogação da alínea f, do inciso V, § 9º, artigo 214 do Decreto nº 3.048/99, nos termos em que promovida pelo artigo 1º do Decreto nº 6.727/09, não tem o condão de autorizar a cobrança de contribuições previdenciárias calculadas sobre o valor do aviso prévio indenizado, vez que, face à ausência de previsão legal e constitucional para a incidência, não caberia ao Poder Executivo, por meio de simples ato normativo de categoria secundária, forçar a integração de tais importâncias à base de cálculo da exação. (...)
(TRF-3 - AMS: 5134 SP 0005134-64.2010.4.03.6102, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, Data de Julgamento: 20/01/2014, QUINTA TURMA)
 Entendimento que é compartilhado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, responsável pelo interior do estado de São Paulo, como se vê:
AVISO PRÉVIO INDENIZADO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NÃO INCIDÊNCIA.
O Decreto nº 3.048/99, em seu art. 214, § 9º, inciso V, alínea “f”, bem como a Instrução Normativa INSS/DC nº 100/03, ambos em vigor, são expressos ao declarar que o aviso prévio indenizado não integra o salário-de-contribuição. Portanto, trata-se, como o seu próprio nome indica, de verba de natureza indenizatória, sobre ela não incidindo contribuição previdenciária. (TRT-15 - RO n.º 0001999-51.2012.5.15.0025, Relator: Desembargador Federal MANUEL SOARES FERREIRA CARRADITA).
Ressaltamos, porém que, conforme já mencionado acima, tais decisões representam a corrente majoritária adotada sobre o tema, CONTUDO, existem decisões em sentido contrário.
Prova desta divergência de opiniões é que nem entre os órgãos do próprio Governo há consenso, a exemplo podemos citar o fato de que o entendimento exarado pela Receita Federal (leia aqui) a favor da incidência de INSS sobre o aviso prévio indenizado não é acompanhado pela Previdência Social (leia aqui), que opina pela não incidência.
Assim, podemos afirmar que existe entendimento jurisprudencial e argumento legal que respaldam uma decisão da IES de optar em não efetuar o pagamento do crédito previdenciário incidente sobre o aviso prévio indenizado.

Todavia, o fazendo, deve estar ciente de que, sobretudo a Receita Federal poderá, eventualmente, proceder alguma autuação ou cobrança judicial, vez que a mesma entende de maneira diversa. E neste cenário de ser a IES autuada ou cobrada administrativa ou judicialmente, terá argumentos para se defender, citando, por exemplo, as decisões aqui já elencadas, como meio de fazer prevalecer o entendimento judicial que é, majoritariamente, diverso.
Sávio Marchi. Advogado. Consultivo e contencioso trabalhista.

12 de maio de 2014

É imprescindível a gestão e o combate à cultura da inadimplência.

A questão da inadimplência no setor educacional e as possibilidades de ações a serem tomadas pela instituição de ensino na tentativa de se recuperar tais créditos...


Em tempos de crise, seja ela global ou pessoal, logo nos vem à mente a questão da inadimplência, eis que essa relação ora mencionada se apresenta como de “causa e efeito”... E, o que é pior, o setor educacional sofre os efeitos dessa inadimplência de forma potencializada e até mesmo injusta, eis que a legislação pátria reguladora da matéria permite alguns excessos e/ou abusos por parte do inadimplente quando determina, dentre outras disposições, que:

·         a obrigação legal da instituição de ensino de manter a prestação dos serviços por todo o período letivo (por todo o ano ou, no caso das instituições de ensino superior, por todo o semestre), mesmo que todas as mensalidades estejam em atraso, bastando que tenha sido paga a matrícula;

·         a multa de apenas dois por cento sobre o valor do débito, que se traduz num incentivo à inadimplência, pois há a certeza de que o aluno poderá freqüentar o curso até o final do período letivo independente de estar em dia com as mensalidades escolares.

Diante do todo acima disposto, tem-se, por vezes, a instalação do caos na instituição de ensino, eis que esta se vê preterida pelos contratantes dos serviços lá prestados com regularidade e eficácia, os quais, sentindo-se protegidos pelas garantias legais de continuação do ensino ao longo daquele mesmo ano e/ou semestre letivo e tendo ainda o poder de exigir da instituição de ensino, por força de disposição legal, os documentos acadêmicos do aluno (dentre os quais se destacam, a título de exemplo, o histórico escolar e o atestado de frequência), quando assim solicitarem, acabam, muitas vezes, por postergar as negociações de suas respectivas dívidas, priorizando, num momento de pouca ou quase nenhuma liquidez financeira, o pagamento de outras contas, cujo o não pagamento impactam em reações automáticas promovidas pela parte contrária...

Nesse sentido, imaginemos que detendo, por exemplo, R$ 500,00 (quinhentos reais), um pai cujo filho esteja vinculado a uma instituição de ensino qualquer tenha que optar, unilateralmente, pelo pagamento da mensalidade devida àquela escola ou, ato contínuo, pagar as contas regulares de água, luz e gás... Por óbvio, o não pagamento dessas últimas contas implicam na imediata interrupção de tais serviços pelas respectivas empresas concessionárias deles, enquanto que a pendência existente junto da instituição de ensino não acarretará nenhum prejuízo imediato a ele e/ou meso a seu filho, donde fica fácil entender a “prioridade” estabelecida pelo mesmo naquele momento...

Ademais, deixando de pagar empréstimos bancários, por exemplo, o devedor fica sujeito ao pagamento de juros extorsivos, além de ter impossibilitado o acesso ao crédito, o que torna o não pagamento das mensalidades escolares a opção que menos prejudica o devedor, seja financeiramente, seja no seu dia-a-dia, uma vez que poderá continuar usufruindo dos serviços até o fim do período letivo, como, inclusive, por nós já ressaltado acima!

De outra sorte, é preciso promovermos a rediscussão do assunto sob todas as suas óticas, sobrepesando também a situação crítica, e por vezes insustentável, vivenciada por tais instituições de ensino ante a toda essa inadimplência, haja vista que as margens hoje adotadas pelo segmento são pequenas (e nem poderiam ser outras considerada a alta concorrência aplicada ao setor) e os custos do negócio, altíssimos...

Segundo dados disponibilizados pelo Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo (SIEEESP) e também pelo Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimento de Ensino Superior do Estado de São Paulo (SEMESP), da pré-escola ao ensino superior (e mesmo nos cursos de pós-graduação) o índice de inadimplência é muito alto, variando entre 10% e 30%, mas chegando a percentuais ainda mais altos, o que não pode mesmo persistir, seja sob qual argumentação contrária for.



Desta forma, inequívoco ressaltar que cabe às instituições de ensino a tomada de medidas mais bruscas para recuperação desses seus créditos, haja vista que a contraprestação educacional fora prestada, na forma contratada, a quem de direito, podendo a mesma assim proceder:

DA NEGATIVAÇÃO DO NOME DO DEVEDOR PERANTE OS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO

Caso a instituição opte por incluir o nome do devedor nos sistemas de proteção ao crédito (SCPC/SERASA), o contrato de prestação de serviços deve mencionar essa possibilidade, determinando após quantos dias/meses de atraso essa providência poderá ser tomada, além da exigência legal, imposta pelo Código de Defesa do Consumidor, do devedor ser cientificado da inclusão de seu nome, o que ocorrerá,  preferencialmente, por carta registrada e com aviso de recebimento - AR.

Vale ressaltar, ainda, que os títulos de crédito, dentre os quais o cheque e a nota promissória, podem ser protestados pelo credor a qualquer momento, independentemente de ter transcorrido o prazo prescricional, sendo que, no Estado de São Paulo, os emolumentos do distribuidor de protestos são pagos pelo devedor quando da baixa do pagamento, ou seja, para protestar os títulos não há custo para o credor. O protesto é geralmente utilizado como última tentativa de recebimento do crédito sem necessidade de ajuizar a ação, e em alguns casos o crédito é recebido nessa fase.

DAS AÇÕES JUDICIAIS CABÍVEIS

Outrossim, caso essa providência supracitada não seja suficiente para a resolução do caso, deve a instituição de ensino valer-se das vias judiciais para a busca desse crédito que lhe pertence por direito, sendo que são 03 (três) as espécies de ações judiciais mais utilizadas para tanto, cada qual com requisitos e características próprias, a saber: (i) ação de cobrança, (ii) ação monitória e (iii) ação de execução (esta última utilizada quando há título de crédito não prescrito em poder do credor).

A GESTÃO DA INADIMPLÊNCIA É O CAMINHO

Seja como for, o fato é que à instituição de ensino compete adotar medidas eficazes que melhorem sua respectiva gestão financeira e coíbam a inadimplência, de forma a garantir-lhe a própria sobrevivência, especialmente em tempos de estreitas margens de lucro, concorrência crescente e pressão por maior produtividade.

Dado importante levantado, num passado recente, por uma empresa de consultoria financeira educacional após averiguação junto a 162 instituições de ensino particular revelou que a situação dessas escolas já é crítica se observada a destinação ideal de sua própria receita, a qual fora assim composta: 50% (cinquenta por cento) dela destinada à folha de pagamento, 18% (dezoito por cento) para pagamento de tributos decorrentes daquela referida atividade; 15% (quinze por cento) gastos em despesas operacionais e/ou não operacionais; 5% (cinco por cento) para custeio de bolsas de estudo e/ou descontos concedidos a quem deles precisa; 5% (cinco por cento) de inadimplência e apenas 7% (sete por cento) como lucratividade, reserva e provisões, de forma que o aumento significativo da inadimplência, como hoje verificado na maioria absoluta dos estabelecimentos de ensino, promove o total desequilíbrio dessa composição/conta, fazendo ruir todo e qualquer negócio, independente da eficácia de sua proposta pedagógica...

Isto posto, diante de todo o cenário acima delineado, é certo que as instituições de ensino não podem manter-se inertes em relação a esse crescente aumento da inadimplência, devendo mesmo atacá-la com veemência e utilizando-se, para tanto, de todas as ferramentas extrajudiciais e/ou judiciais necessárias...

30 de abril de 2014

Carteirinha de estudante: aceitação obrigatória? Quando? Onde?

Muitas, e por vezes desencontradas, são as informações havidas sobre a (i)legalidade da utilização da carteirinha de estudante em espetáculos artístico-culturais e esportivos diversos, o que sempre dá asas às mais diversas confusões havidas sobre o tema.

Contudo, se no passado a sistematização do aludido benefício era firmada apenas através de uma Medida Provisória, não sendo este o meio não adequado para tanto, o fato é que agora há uma lei em vigor tratando de todas as particularidades relacionadas ao tema, a saber, lei n.º 12.933, de 26 de dezembro de 2013.

E, nesse sentido, temos preservado aos estudantes o direito de pagamento de meia entrada em salas de cinema, cineclubes, teatros, espetáculos musicais e circenses e eventos educativos, esportivos, de lazer e de entretenimento realizados em todo o território nacional, ainda que esse direito seja exercido sob limitações, a saber:

  • A condição de estudante é requisito básico para a reivindicação de tal direito;

  • A comprovação dessa condição de estudante é feita através da vinculação havida entre este e a instituição de ensino que lhe presta serviços educacionais;

  • Quando da aquisição do ingresso pretendido e também na portaria do local de realização do evento, deverá o estudante apresentar sua Carteira de Identificação Estudantil (CIE) emitida pela UNE, UBES, pelos Diretórios Centrais dos Estudantes e/ou pelos Centros e Diretórios Acadêmicos das instituições a que ele se vincula;

  • Seja qual for a carteira de estudante apresentada, é preciso que nela conste prazo de validade do vínculo existente entre o aluno e a instituição de ensino, o qual deverá ser renovável a cada ano e que a mesma detenha um padrão mínimo de informações comuns, tal como disponibilizado pelo Instituto Nacional da Tecnologia da Informação (ITI), sendo ainda certificada digitalmente por tal órgão.

  • Na ausência de uma carteira de estudante, poderá ser apresentada uma declaração de vínculo estudantil fornecida pela instituição de ensino, desde que acompanhada de um documento oficial e com foto do aluno e do último boleto da mensalidade paga, quando tal instituição for privada.

  • As carteirinhas de estudante terão validade, sejam em que circunstância for, até o dia 31 de março do ano subsequente ao de sua emissão.

  • Os organizadores de eventos culturais e esportivos deverão disponibilizar as meias entradas, condicionando-as a 40% (quarenta por cento) da totalidade dos ingressos a serem comercializados no citado evento, afixando, em local de fácil visualização nos pontos de venda, informativos acerca do eventual esgotamento desses ingressos promocionais quando atingido o seu limite de concessão.

  • O referido benefício da meia entrada não será aplicado para aquisição de ingressos relacionados à Copa do Mundo FIFA de 2014 e também para as Olimpíadas do Rio de Janeiro de 2016.


Com base em todas as informações supracitadas, cabe aos estudantes exercerem, com afinco e objetividade, seus respectivos direitos e em caso de recusa imotivada da empresa administradora desses espetáculos e/ou eventos culturais e esportivos em cumprirem com as disposições legais, o caminho natural a ser seguido é a representação das mesmas perante o PROCON local!

15 de abril de 2014

Encerramento de curso/turma por falta de alunos: possibilidade!

A questão da legalidade do encerramento de um curso ou de uma turma diante do número mínimo de alunos que o frequentam é importantíssimo para diversas instituições de ensino, inclusive, faculdades, escolas de cursos livres, e até mesmo escolas de ensino médio e fundamental. A questão precisa ser pontuada, como abaixo, se verifica. 

Tal como previsto pelo artigo 207 da Constituição Federal de 1988, as instituições de ensino gozam, por direito, de autonomia didático científica e de gestão financeira e patrimonial. Assim, podemos então afirmar, categoricamente, que a manutenção, ou não, de uma determinada turma e/ou curso por ela ofertado quando este é frequentado por um número insignificante de alunos configura-se ato unilateral decorrente dessa autonomia gerencial do próprio negócio quando precedida de alguns cuidados a serem a seguir elencados, não sendo dada procedência aos eventuais pleitos de danos morais eventualmente requeridos pelos alunos afetados, nessas situações.

Em verdade, a relação estabelecida entre aluno e instituição de ensino, embora pautada numa expectativa de sequencia dos estudos ali ministrados, perfaz-se anualmente e/ou semestralmente, conforme bem dispõe as condições norteadoras do curso em questão, as quais devem, necessariamente, serem firmadas em instrumento contratual próprio.

Assim, caso haja cláusula contratual expressa nesse instrumento regulador da relação havida entre aluno X instituição permitindo a esta última a possibilidade de não composição, para o próximo ano e/ou semestre, da turma até então existente, caso não fosse atingido o número mínimo de alunos necessários à manutenção da mesma, tem-se que a instituição poderia assim agir, desde que esse “número mínimo” fosse prévia e formalmente indicado e, na eventualidade de ocorrência dessa hipótese, fossem os alunos remanescentes amparados através de convênio a ser firmado pela instituição que encerra suas atividades e uma outra, que os receba em curso e turma similares, aproveitando todo o ensino já adquirido até então por estes mesmos alunos.

Essa é, inclusive, a inteligência do todo discutido pela apelação julgada, recentemente, pelo TJSP (processo n.º 0051356-25.2009.8.26.0000, proveniente da Comarca de São Paulo, SP), cuja ementa abaixo segue:

Indenização. Danos morais. Prestação de serviços educacionais. Encerramento de curso em virtude da insuficiência de alunos matriculados. Prerrogativa do estabelecimento de ensino prevista contratualmente. Ré que firmou convênio com outra instituição garantindo condições especiais para a transferência dos alunos matriculados no curso extinto. Ausência de ato ilícito apto a gerar indenização por dano moral. Ação julgada improcedente. Sentença mantida. Recurso improvido.

Temos, diante do todo supracitado, que tal estipulação contratual não é abusiva, eis que, como invocado, ela encontra amparo no ordenamento jurídico pátrio.

E para que não paire dúvida nenhuma acerca dessa legalidade de ação por parte das instituições de ensino (desde que respeitadas (1) a previsão dessa ocorrência no contrato norteador de tal relação, e (2) prestado o auxílio/encaminhamento dos alunos remanescentes desse curso encerrado para outra instituição a ser conveniada e que os receba aproveitando todo o aprendizado até então a eles ofertado), ressaltamos, na íntegra, o posicionamento adotado pelo eminente Desembargador Nelson Jorge Júnior, por ocasião do julgamento da Apelação n.º 0086027-74.2009.8.26.0000, tendo ele assim consignado que:

“... o fechamento do curso no final do semestre letivo por ausência de número mínimo de alunos que viabilize a sua manutenção é ato discricionário da instituição de ensino, que, segundo o artigo 207 da Constituição Federal, goza de 'autonomia didático-científica e de gestão financeira e patrimonial'. Além disso, cumpre salientar que de acordo com o artigo 53 da Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que regulamenta a citada autonomia das universidades, prevê em seu inciso I, a atribuição de extinguir cursos de educação superior.
Assim, estando expresso no instrumento contratual, bem como previsto em Lei Federal que regula as instituições de ensino no país, verifica-se que a extinção do curso pela ré se deu em exercício regular de seu direito. E essa cláusula contratual não enseja intelecção no sentido dela estar a descumprir os direitos do consumidor, porquanto o encerramento se deu pelo número reduzido de alunos, o que inviabilizou a continuidade, ou seja, razões de ordem econômica e financeira impossibilitou aquele prosseguimento e, portanto, não se trata de ato abusivo ou propaganda enganosa. Logo, havendo amparo na lei para que o instituto de educação pudesse encerrar aquela classe de ensino, não há que se cogitar na existência de prejuízo material ou moral, visto ter sido praticado ato lícito” (TJSP - 17ª Câm. Dir. Priv. - j. 20/03/2013).

Cumpre ainda observar em ambos os casos acima relacionados que a instituição de ensino encerrou os cursos por ela até então disponibilizados pelo acentuado déficit financeiro ali havido, o que certamente não ocorreria se houvesse o número mínimo de alunos, sendo certo que, até então, os serviços foram efetivamente prestados, cabendo observar que, mesmo diante do encerramento do curso, tais instituições não abandonaram os alunos à própria sorte, mas firmaram convênios com instituições conceituadas e similares, garantindo condições especiais para seus egressos.

Assim sendo, não há como se reconhecer a prática de ato ilícito capaz de gerar dano moral indenizável, posto que foi facultado à recorrente a transferência para outro estabelecimento de ensino, com aproveitamento das matérias estudadas.

Ocorre que para caracterizar o dano moral não basta a existência de qualquer contrariedade, dissabor ou incômodo, sendo necessária a existência de dano grave a direito de personalidade, dano este que deve estar relacionado a um comportamento ilícito de outrem. Caso contrário, não se cogita da responsabilidade prevista no artigo 186 do Código Civil.

Esta é, inclusive, a posição adotada pelo Tribunal de Justiça de são Paulo acerca do assunto, como abaixo se percebe:

“APELAÇÃO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS – Descontinuidade do curso em razão da insuficiência de alunos - Aplicação do artigo 53 da Lei n. 9.394/96 - NÃO CONFIGURAÇÃO DO ILÍCITO - AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS A ENSEJAR A REPARAÇÃO DE DANOS - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito - O autor não se desincumbiu do ônus de demonstrar fato constitutivo do seu direito - Não restou demonstrado que a conduta por parte da ré tenha causado sofrimento passível de indenização - Danos não demonstrados - Inteligência do artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil e do artigo 186 do Código Civil - Sentença mantida - Recurso improvido” (TJSP - Apelação n° 9151665-32.2008.8.26.0000 - Rel. Des. LUIS FERNANDO NISHI 32ª Câm. Dir. Priv. - j. 12/04/2012).

Veja que efetivamente uma assessoria e consultoria adequada pode tornar o gerenciamento das instituições de ensino mais seguro e efetivo, garantindo que decisões gerenciais possam ser adotadas com o menor risco possível, expondo de maneira minimizada a instituição e seus interesses.

4 de abril de 2014

Professores em turmas aglutinadas: direito a remuneração dobrada?

Todos sabemos que as Instituições de Ensino Superior adotam medidas específicas para bem gerenciar os cursos que oferecem e, até mesmo, diante da taxa de inadimplência, da grande concorrência que o mercado impõe, adotam estratégicas de gestão com a finalidade de tornar rentáveis ou, pelo menos, equilibrados os custos financeiros de um ou outro curso.

Nesta esteira, como sabemos, uma das alternativas é aglutinar as turmas, reunindo mais de uma sala de aula, no mesmo horário, com um único professor que ministra alguma disciplina que é comum a diferentes períodos ou até mesmo diferentes cursos.

Contudo, há algumas considerações de ótica trabalhista e possíveis dicas que são importantes neste sentido. O contrato de trabalho não pode ser alterado unilateralmente em prejuízo ao trabalhador, sem o consentimento deste. Sendo assim, é sempre muito importante que o professor seja já contratado ciente, e expressamente ciente, de que a aglutinação de turmas é possível, ou, então, caso seja necessário aglutinar turmas posteriormente à contratação do professor, que este sinalize, por escrito, em uma declaração, de que aceita com referida mudança contratual e que reconhece não haver prejuízo (leia-se: não há diminuição de horas aulas em seu holerite). Realmente, e, por fim, é muito importante conhecer esse último detalhe e observá-lo no cotidiano: se o professor A lecionou durante X anos para duas turmas separadas e a partir de determinado ano passa a lecionar somente para uma turma aglutinada ele poderá demonstrar que teve diminuição salarial ao ter diminuída sua carga horária. Nestes casos sugere-se que de algum modo não ocorra diminuição salarial, mesmo diante de possível concordância.

Vejamos a última decisão do TST (Tribunal Superior do Trabalho) sobre o assunto, ponderando nossas dicas iniciais e confirmando-as:

Ementa: 
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROFESSOR. DIFERENÇAS SALARIAIS. AGLUTINAÇÃO DE TURMAS. Diante da possível má aplicação do art. 468 da CLT, determina-se o processamento do Recurso de Revista. RECURSO DE REVISTA. PROFESSOR. DIFERENÇAS SALARIAIS. AGLUTINAÇÃO DE TURMAS. A regra que vigora no Direito do Trabalho é a de que as condições ou cláusulas do contrato de trabalho não podem ser modificadas unilateralmente pelo empregador. Nesse contexto, as cláusulas convencionadas, expressa ou tacitamente, quando da contratação do empregado, não podem ser alteradas no curso do contrato de trabalho, de modo a causarem prejuízos ao Obreiro. Na hipótese dos autos, contudo, incontroverso que o Reclamante, desde o início da contratação, ministra aulas em turmas aglutinadas, não havendo outro contexto fático que demonstre a reconhecida alteração contratual. Isso porque a aglutinação das turmas, por si só, não configura alteração do pactuado, nos moldes do art. 468 da CLT, se não demonstrado que, no início da relação contratual, o contexto no qual as atividades se desenvolviam eram diferentes. Portanto, diante do quadro fático delineado pelo Regional, ocorreu a má aplicação do art. 468 da CLT. Recurso de Revista conhecido e provido.

Processo: RR - 1474-86.2011.5.11.0002 Data de Julgamento: 29/05/2013, Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 07/06/2013. 

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18 de março de 2014

Fotos de alunos expostas na internet e a responsabilidade da instituição de ensino!

Fotografias tiradas de alunos e utilizadas de modo pejorativo ou vexatório por outros alunos não geram obrigação alguma para a instituição de ensino

Decisão interessante fora publicada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo recentemente, eis que o assunto em pauta é bastante polêmico e atual, na medida em que reúne, num só caso, as questões contratais relacionadas à prestação de serviços educacionais (ou seja, o objeto de maior discussão nesse nosso espaço) e a velocidade da informação pelas vias digitais/tecnológicas.

Ocorre que no caso supracitado, um aluno da educação infantil de determinada instituição, com 06 (seis) anos de idade, fora fotografado, por outros alunos maiores e também vinculados a ela, no banheiro daquela escola, sendo que essas imagens íntimas do menor foram posteriormente disponibilizadas, em tom jocoso, em um site criado pelos mesmos alunos para divulgação de “ocorrências” do colégio.


Assim, ao descobrir a disponibilização dessas imagens, a mãe do aluno fotografado requereu as providências policiais para retirada dessas fotos do aludido site, bem como ingressou com uma ação indenizatória movida contra a instituição de ensino, alegando ter havido, no caso em tela, uma má prestação dos serviços educacionais ali ofertados na medida em que o educandário não fazia, na ocasião, qualquer distinção, por idade dos alunos, no uso daquele banheiro onde tais fatos ocorreram.

Entretanto, agindo de forma bastante ponderada, a sentença proferida no caso em tela julgou totalmente improcedente o pleito dessa família autora, eis que (1) a aparente indignação da autora pautou-se não na existência em si da foto, mas no fato dela estar sendo disponibilizada no site criado por alunos da escola, o que deu-se fora de suas dependências e sem qualquer ingerência dos representantes legais desta; e (2) a escola, tão logo tenha tomado conhecimento dos fatos, tratou de chamar os alunos envolvidos no caso e os advertiu formalmente, fazendo-os ainda pedirem desculpas ao aluno vítima.

Isto posto, não se pode olvidar que, mesmo em se adotando a teoria da responsabilidade objetiva, o dever de indenizar surge apenas quando verificados o dano e a relação de causalidade entre este e o defeito na prestação dos serviços, dispensando-se apenas a comprovação da culpa. E esse requerido “nexo causal” não fora comprovado pela autora de tal ação, sendo, portanto, legítima a improcedência dada à causa como medida de direito!

Apelante: Fabiano de Souza Faria Júnior (menor)
Apelada: Sociedade Educacional Palmarino Calabrez Ltda EPP
Comarca: São Paulo - Fórum Regional de Itaquera - 2ª Vara Cível
Relator Ruy Coppola
Voto nº 26.547
EMENTA
Agravo retido. Ação de indenização por danos morais. Decisão que indeferiu a contradita de testemunha. Vínculo empregatício existente entre a testemunha e a parte que não significa, por si só, tenha ela interesse no litígio. Depoimento que, ademais, não foi determinante para o julgamento da causa. Ausência de prejuízo. Recurso improvido.
Indenização. Danos morais. Prestação de serviços educacionais. Estabelecimento de ensino que responde objetivamente pela reparação dos danos causados aos alunos por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Fotografia do autor tirada por outros alunos quando este utilizava o banheiro da escola. Dano que decorreu da sua divulgação via internet, o que ocorreu fora das dependências da escola, por meio de site pertencente aos próprios alunos. Nexo causal não demonstrado. Ação julgada improcedente. Sentença mantida. Apelo improvido.

No mais, temos que a decisão completa havida sobre o caso em comento, que, por sua vez, pode se repetir a qualquer momento, em qualquer instituição de ensino, pode ser observada através deste link   .


6 de março de 2014

A instituição é obrigada a dispensar alunos de atividades por motivo religioso?

O aluno que pretende ser dispensado de atividades e avaliações alegando obrigações religiosas deve ser atendido pela instituição? Existe obrigação legal ou contratual para que a escola trate de forma diferenciada esses alunos?

A liberdade religiosa é prevista constitucionalmente. No mesmo sentido é regulamentada a atividade educacional, inclusive, complementada pela Lei de Diretrizes e Bases. Um dos embates entre estes dois direitos regulamentados é a possibilidade e ou o direito de alunos da Igreja Adventista do 7o Dia terem abonadas suas faltas nas noites de sexta-feira ou atividades de sábado.

A posição que mais tem aparecido nas decisões jurisprudenciais é aquela que não permite ao aluno faltar ou ser dispensado, nem abona faltas, quando o motivo é de cunho religioso. Isso por que, ao aderir ao contrato da instituição de ensino o aluno conhece antecipadamente as regras, firma um contrato onde reconhece a necessidade de comparecer a provas e atividades naqueles dias. Ao fazer a escolha pela instituição esta passa a ter o direito de tratar todos os alunos com igualdade de condições.

E nesse ponto, como tem destacado a jurisprudência, é preciso dar tratamento igual aos alunos, qualquer que seja sua escolha religiosa. Então, dispensar uns e não dispensar outros certamente pode ferir o direito de igualdade, de isonomia. 

Confira o último julgado do Tribunal Regional Federal da 3a Região que não liberou o aluno que impetrou Mandado de Segurança, mantendo-o reprovado, neste link do site Consultor Jurídico (clique aqui).

24 de fevereiro de 2014

"Desconto para irmãos" é obrigatório ou opcional?

A escola não é obrigada a conceder o chamado "desconto para irmãos".

Não raro há pais que procuram as secretarias e/ou tesourarias das instituições de ensino que prestam serviços educacionais a seus filhos para então pleitear, por vezes de forma contundente, direito que alegam ter no tocante à concessão de descontos aplicados aos valores de anuidade de segundos e/ou demais alunos de uma mesma família contratante.

Entretanto, é preciso tratarmos o assunto com a cautela necessária e então analisarmos se esse “direito” é mesmo real ou apenas fruto de uma prática habitual adotada, como estratégia mercadológica de fidelização de clientes, pelas escolas em geral?

Em verdade, o que é preciso ressaltar é que a relação jurídica estabelecida entre alunos e instituições de ensino é uma típica relação de consumo, sujeita, portanto, aos princípios e normas cogentes de ordem pública e interesse social, tal como previstas no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). Ademais, tal relação fora, posteriormente, melhor tratada e/ou complementada com o todo trazido pela lei nº 9.870/99, onde direitos foram assegurados aos alunos, como, por exemplo, aquele relacionado à condições norteadoras da  renovação da matrícula, a proibição de suspensão de provas escolares, a proibição de retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas decorrentes de eventuais inadimplementos financeiros.

Desta forma, temos que a relação em comento deve estar totalmente pautada nas diretrizes trazidas pela Constituição Federal pátria, analisada em conjunto com os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor e da Lei de Anuidade Escolar, acima citada. E, se nenhum dos três ordenamentos em questão traz, expressamente, a obrigação atribuída às escolas de concederem descontos progressivos para segundos, terceiros ou mais filhos de uma mesma família contratante ali matriculados, não há, por conseguinte, legitimidade alguma nessa obrigação que muitos pais tentam imputar a tais instituições.

Aliás, o embasamento jurídico trazido por esses pais ao pleitearem e/ou exigirem esse “direito” que imaginam deter é o artigo 24 do Decreto-Lei n.º 3.200, de 1941, que expressamente determina que “as taxas de matrícula, de exame e quaisquer outras relativas ao ensino, serão cobradas com as seguintes reduções, para as famílias com mais de um filho: para o segundo filho, redução de vinte por cento; para o terceiro, de quarenta por cento; para o quarto e seguintes, de sessenta por cento”.

Entretanto, o que muitos desconhecem, embora legítimo, é que essa obrigação acima disposta não fora recepcionada pela CF/88 e pelos novos parâmetros fixados pelo Decreto-lei 532/69, nem tampouco pela legislação posterior que trata das questões relacionadas ao consumo em geral (Código de Defesa do Consumidor – lei n.º 8.078/90), nem por aquela que trata das condições para fixação da anuidade escolar (lei n.º 9.870/99), estando, portanto, tacitamente revogado tal artigo  24 do decreto-lei 3.200/41.

Assim, resta comprovado que eventual desconto concedido atualmente pelas instituições de ensino a título de “desconto irmãos” ocorre por total liberalidade desta, não havendo qualquer legitimidade dos pais que tentam impô-lo no grito, seja a que título ou tempo for.

Esta, inclusive, é a inteligência da jurisprudência mais atual havida sobre o tema, como abaixo transcrito:

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – 26a Câmara. APELAÇÃO COM REVISÃO N° 945.685-00/2 SÃO PAULO. EMENTA: A bonificação concedida em razão da condição familiar de irmãos matriculados na mesma escola constitui mera liberalidade da prestadora de serviço, tendo em vista a revogação tácita do art. 24 do Decreto-Lei 3.200/41 por legislação posterior que regulou toda a matéria e não previu o referido desconto. Portanto, a cobrança deverá se basear no valor da parcela vencida sem o referido desconto.

APELANTE: ********. APELADA: ********. EMENTA: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE EDUCAÇÃO – MENSALIDADES ESCOLARES – COBRANÇA – IRMÃOS MATRICULADOS NO MESMO ESTABELECIMENTO DE ENSINO – INADIMPLÊNCIA COMPROVADA – DESCONTO – LIBERALIDADE DO PRESTADOR DE SERVIÇOS – CONTRATO – DEVER DE CUMPRIMENTO – LITIGÃNCIA DE MÁ-FÉ NÃO CARACTERIZADA – RECURSO PROVIDO... Busca-se na presente ação o recebimento de mensalidades escolares devidas pela ré apelada, tendo como alunos e beneficiários seus três filhos. Da pretensão inicial extrai-se que as parcelas cobradas referem-se ao ano letivo de 2003, sendo que estão em aberto as mensalidades dos meses de março e abril dos filhos Felipe e Marcus Vinícius, e as parcelas dos meses de março, abril, maio, junho e julho da filha Amanda. Os documentos de fls. 25/27 comprovam a relação jurídica entre as partes, garantindo a viabilidade da presente ação de cobrança. E, na cópia reprográfica juntada às fls. 66 pela própria apelada, há reconhecimento expresso de parte da dívida pleiteada, não havendo nos autos insurgência quanto às demais parcelas cobradas, resultando incontroversa a dívida e sua exigibilidade. Insurge-se a autora apenas quanto ao valor devido, devendo para tanto ser apurada a natureza jurídica do desconto concedido aos alunos, filhos da apelada, e a possibilidade de cobrar o valor integral da mensalidade no caso de inadimplência, acrescido de juros e multa. Os documentos de fls. 25/28 e 36/37 servirão de base para o deslinde da controvérsia, considerada sua posterioridade em relação àqueles juntados às fls. 62/64. Nesse sentido, no ano letivo de 2003, em que Amanda e Felipe cursaram a 5a série do ensino fundamental, e Marcus Vinícius, a 8a série, era pago o valor líquido de RS 28,60 para o aluno Felipe (93% de desconto), R$ 330,01 para Amanda (16,7% de desconto) e R$ 28,60 para Marcus Vinícius (92% de desconto). As bonificações, nos termos da primeira observação constante nas fichas financeiras de fls. 25/27, decorrem da condição familiar dos alunos. O desconto para irmãos matriculados no mesmo estabelecimento de ensino era garantido pelo Decreto-lei 3.200/41, que dispõe sobre a organização e proteção da família, não recepcionado pela Constituição Federal de 1988, e pela implantação de novo sistema nos termos do Decreto-lei 532/69, que passou a regular a “fixação e o reajuste de anuidades, taxas e demais contribuições correspondentes aos serviços educacionais, prestados pelos estabelecimentos federais, estaduais, municipais e particulares” (art. 1º).Nesse sentido, o seguinte aresto do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “DIREITO ECONÔMICO. ENSINO. MENSALIDADE ESCOLAR. DESCONTO PARA MAIS DE UM FILHO ESTUDANTE DO MESMO COLÉGIO. IMPOSSIBILIDADE. REVOGAÇÃO DO ART. 24 DO DECRETO-LEI 3.200/41. LICC, ART. 2o, § V. RECURSOS PROVIDOS. Não persiste o desconto na mensalidade escolar em virtude de mais de um filho estudar na mesma escola, tendo em vista a revogação tácita do art. 24 do Decreto-Lei 3.200/41 por legislação posterior que regulou toda a matéria e não previu o referido desconto. (REsp 168339/SP RECURSO ESPECIAL 1998/0020643-4, Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, 4a Turma, DJ 16.08.1999p. 74 RJADCOAS vol. 3p. 64).” Em face disso, a bonificação concedida em razão da condição familiar dos filhos da apelada constitui-se mera liberalidade do estabelecimento de ensino prestador de serviço. Verificada a natureza estritamente contratual da bonificação atribuída aos filhos da apelada, de rigor observar-se a vontade das partes na contratação, em obediência ao princípio do “pacta sunt servanda ” e da livre vontade de contratar. As fichas financeiras de fls. 25/27 prevêem, expressamente, a solução para o presente caso, ao dispor que “após o vencimento serão cobrados juros e multas sobre o valor integral. Não se pretende aqui olvidar da nova sistemática civilista na busca da melhor interpretação das disposições contratuais de forma a atender a função social do contrato, mas sim, considerar a vontade das partes para alcançar a estabilidade das relações contratuais. Do exposto, a cobrança deverá se basear no valor da parcela vencida sem o desconto por condição familiar, ou seja, R$ 396,41 para cada aluno, acrescida de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação (art. 405 do atual Código Civil) e multa de 2% ao mês, nos termos do artigo 52, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, aplicável à espécie. Por fim, não verificada qualquer das hipóteses autorizadoras desta medida no artigo 17, do Código de Processo Civil, improcede o pedido de condenação da autora às penas por litigância de má-fé. Dou provimento ao recurso para julgar integralmente procedente a ação de cobrança e condenar a apelada ao pagamento das mensalidades cobradas nos termos acima expostos, fixados os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, a cargo da ré. Norival Oliva – Relator.

Desta forma, ainda que o PROCON/SP incite os pais de mais de dois filhos em idade escolar e vinculados a uma mesma instituição de ensino a requerer tal desconto com base no já citado artigo 24 do Decreto- Leia n.º 3.200/41, o fato é que não existe legitimidade nenhuma a tal pleito, podendo a escola se negar a concedê-lo, caso não seja essa uma prática comercial por ela adotada, defendendo-se com total embasamento diante de uma discussão judicial havida sobre o tema, que, aliás, deverá, por direito, ser julgado improcedente.

Cordialmente,


CMO ADVOGADOS
Cláudio Pereira Júnior

Luis Fernando Rabelo Chacon

12 de fevereiro de 2014

É possível solicitar comprovação de quitação de débitos com outra escola no ato da matrícula?

No ato do pedido de transferência e matrícula a instituição de ensino pode solicitar comprovação da quitação de débitos das mensalidades escolares da outra instituição?

Uma das situações que muitas vezes pode ser adotada como forma de combate à inadimplência escolar é a negativa de matrícula para alunos que estejam com débitos em outra instituição de ensino. Realmente, a escola particular tem o direito de recusar a matrícula, não estando obrigada a aceitar a matrícula de aluno que sabidamente está em débito com a instituição de ensino da qual está vindo transferindo.

Logicamente, o que não é permitida é a criação de uma listagem de inadimplentes, como foi chamada de “lista negra” ou cadastro de inadimplentes em instituições de ensino. Isso, certamente, ofenderia a privacidade e até seria vexatório. Contudo, não se confunde com o direito que a escola particular tem de aceitar ou não a matricula de um aluno nas condições acima expostas.

O que se tem em mente é que a instituição de ensino pode exigir comprovação da idoneidade financeira do aluno ou seu responsável. Sabe-se que o aluno inadimplente não pode sofrer sanções administrativas ou pedagógicas como a retenção de documentos, não realização de provas, etc.

Contudo, a escola que é procurada para o pedido de transferência tem o direito de conhecer os riscos sobre os quais recai aquela possível contratação. O fato é que a legislação vigente não proíbe a conduta acima apontada e, por isso, ela está autorizada, obviamente, com bom senso e limites para garantir que direitos do aluno não sejam violados.

O artigo 5º da Lei 9870 de 1999 que dispõe sobre mensalidades escolares, expõe que a escola pode negar a rematrícula do aluno inadimplente. O artigo 6º dispõe que o desligamento só pode ocorrer ao final do ano ou semestre letivo, não sendo lícito deixar de emitir documentos para a transferência do aluno.

No mesmo artigo 6º, em seu parágrafo 3º, o legislador dispõe que serão asseguradas as matrículas dos alunos que tiveram os contratos com a instituição privada suspensos em virtude do inadimplemento em estabelecimentos públicos de ensino fundamental e médio, inclusive, o parágrafo seguinte dispõe que se os pais não providenciarem a matrícula no estabelecimento público o órgão público estatal deverá fazê-lo de forma a garantia a continuidade do estudo.

Então, existe obrigatoriedade de matrícula apenas para a rede pública de ensino no caso dos alunos provenientes de instituições particulares cujos contratos não tenham sido renovados por movido de inadimplência. Não há exigência para a rede particular de ensino no sentido de receber alunos inadimplentes de outra instituição.
Isso se dá pela aplicação do princípio da liberdade contratual, da liberdade de contratação e também na função social do contrato, sobretudo, aqui, por que a escola particular não pode amargurar riscos financeiros para atender uma obrigação que é do Estado (garantir a educação de todos), até para evitar a inviabilização econômica do negócio o que demanda também interesse público (garantia da existência da empresa, garantia dos empregos que gera, garantia dos recolhimentos tributários, etc.).

Nossa opinião está, inclusive, de acordo com parecer jurídico exarado pelo Ministério Público do Estado do Ceará, no Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor – PROCON, em 16 de maio de 2008.

Logicamente e, por fim, a instituição de ensino não pode expor desnecessariamente a pessoa do aluno ou responsável financeiro pelo contrato, devendo atuar com todo o zelo necessário não somente quando da exigência como quando da informação de negativa de matrícula, mantendo a vida privada e a dignidade das pessoas envolvidas devidamente intactas e protegidas, evitando com isso possíveis ações de indenização por supostos danos morais ou materiais.


Conclui-se, então, que a instituição privada de ensino não é obrigada a receber e aceitar a matrícula de aluno inadimplente em outra instituição podendo, inclusive, solicitar a comprovação da quitação das mensalidades perante a outra escola tendo em vista que a lei não proíbe que tal ato seja praticado e, principalmente, garante ao aluno que teve a matrícula recusada seja efetivamente matriculado em rede pública de ensino, dando guarida à continuidade educacional constitucionalmente garantida.

6 de fevereiro de 2014

Material escolar: a lista dos proibidos!

Nesse período de matrículas e início do ano letivo, como já foi antecipado por este BLOG, a entrada em vigor de legislação (Lei 12886/2013) que regulamenta as questões relacionadas ao material escolar trouxe dúvidas para pais e gestores. O objetivo desta postagem é sob o ponto de vista legal orientar os interessados.


De fato, como sempre acontece, quando uma lei nova entra em vigor, ainda mais apontando direitos aos consumidores, estes fazem certo alvoroço, porém nem todos compreendem ao certo o problema envolvido, muito menos a solução e a intenção proposta pela nova legislação. Alguns, inclusive, buscam destorcer a real aplicabilidade da norma em benefício próprio, o que não deve proceder.

O fato é que não há impedimento algum para que uma escola venda material de ensino em suas dependências. Ela não pode obrigar o pai ou o aluno a comprar no local, sob pena de ser caracterizada prática abusiva prevista no artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor, alicerçada como "venda casada". Então, a escola pode efetuar a venda de material escolar em seu estabelecimento, obedecendo as normas em vigor para o exercício de tal atividade que é, certamente, diferente do seu objetivo social principal que é ofertar o ensino.

Mas, não é por esse motivo que a legislação apontada entrou em vigor. Na verdade, há muito tempo observou-se que as instituições de ensino exigiam na lista do material escolar do aluno itens que efetivamente seriam utilizados em prol de todos os alunos (chamados materiais de uso coletivo) e que, portanto, não poderiam ser exigidos individualmente. Muitas escolas incluíam na lista de material escolar grampeador, papel higiênico, giz, álcool, etc., produtos que não eram de uso individual. Com isso a instituição de ensino reduzia seu custo operacional transferindo ao consumidor uma obrigação financeira que não era compatível com o contrato de prestação de serviços assinado, onde se pressupões que a mensalidade é o necessário e suficiente para cobrir todos estes gastos coletivos que são, por tudo o que foi apontado, responsabilidade da escola.

Então, a instituição de ensino está proibida de pedir produtos na lista de materiais que sejam de uso coletivo vinculados, sobretudo, como itens de escritório, de limpeza, de atividades coletivas, etc. Já havia um consenso entre PROCON, Ministério Público e até mesmo instituições de ensino de que só material pedagógico de uso individual poderia ser indicado na lista de material. A lei só veio confirmar isso, sacramentando o assunto.

E o gestor perguntaria: e o custo disso, quem assume? Ora, na composição do preço da mensalidade escolar deverá a instituição de ensino considerar o custo, inclusive, documentando e arquivando o necessário para, caso seja solicitado, comprovar e justificar as razões de eventual aumento, para que não se considere abusivo. Isso também está autorizado pela própria legislação.

No mais, surgiram questionamentos quanto ao uniforme. Tal questão é mais complexa, pois como eles detém um logotipo da instituição de ensino não podem ser produzidos por qualquer confecção, senão quando efetivamente autorizados pela escola. Por isso, esta pode direcionar, com legitimidade para tanto, a cessão da marca para confecção de material e uniformes com o logotipo da escola, não sendo possível que qualquer outro estabelecimento não autorizado produza ou venda referidos uniformes.

Logicamente, não seria permitido que preços abusivos sejam praticados. Aconselhamos sempre que as escolas e os pais, conjuntamente, acompanhem não somente a qualidade do produto como o valor cobrado em comparação com o que existe no mercado. E como não é objetivo da escola ter vantagem financeira direta com isso, que indique nova confecção ou até mesmo promova autorização para mais de uma, visando que o mercado ajuste o preço da forma mais equilibrada possível. Aqui a regra é o bom senso!

Quer saber mais detalhes sobre qual material entra ou não entra na lista? Confira aqui uma matéria do PROCON RJ.

Até a próxima postagem!