5 de junho de 2012

A inadimplência e o direito de renovar a matrícula no ensino superior.



João se matriculou no ensino superior. Pagou com sacrifício o primeiro semestre da faculdade, mas no segundo semestre, apesar de devidamente matriculado, não suportou o peso das mensalidades e se tornou inadimplente. A instituição de ensino pode impedir que ele faça provas ou retire documentos? Não, pois ele tem direito de cursar aquele semestre regularmente, mesmo com débitos. Ele poderá renovar a matrícula para o terceiro semestre? Não. A lei garante que a instituição não autorize a renovação da matrícula em virtude do inadimplemento.


Vamos entender porque e o que pode ser feito pela instituição para se proteger!


Realmente, um dos temas mais calorosos nas instituições de ensino superior privado é o inadimplemento dos alunos e o direito de renovação da matrícula. Sabemos que o setor privado é o grande responsável pelo aumento efetivo da disponibilidade de vagas e da efetiva matrícula de novos alunos no ensino superior brasileiro.


Com isso, obviamente, o setor também enfrenta o inadimplemento e se depara com uma legislação especial que regulamenta o assunto. Ao contrário de uma loja que pode recusar a entrega do produto em virtude do pagamento do preço, a instituição de ensino deve se atentar aos detalhes legais que, obviamente, regulamentam um serviço público essencial, que é a educação.


A instituição de ensino não pode punir pedagogicamente o aluno, retendo documentos, evitando que realize provas. A lei entretanto garante o direito de recusar a matrícula para o próximo semestre sempre que houver atraso superior a 90 dias, mesmo que numa única mensalidade. Portanto, se o aluno está matriculado e se torna inadimplente ele não pode ser punido com atos exclusivos ao longo do semestre, pode ser notificado para regularização da sua situação e até mesmo com aviso de que sua matrícula não será renovada, contudo, aquele semestre será aproveitado.


Esse posicionamento está consolidado na jurisprudência pátria, como se vê em vários julgados do próprio STJ (Superior Tribunal de Justiça):



- “A Constituição Federal,  no  art.  209,  I,  dispõe  à  iniciativa  privada  o  ensino, desde  que  cumpridas  as  normas  gerais  da  educação  nacional.  A  Lei  9.870/99, que  dispõe  sobre  o  valor  das  mensalidades  escolares,  trata  do  direito  à renovação  da  matrícula  nos  arts.  5°  e  6°,  que  devem  ser  interpretados conjuntamente.  A  regra  geral  do  art.  1.092  do  CC/16  aplica-se  com temperamento,  à  espécie,  por  disposição  expressa  da  Lei  9.870/99.  O  aluno,  ao matricular-se  em instituição  de ensino  privado,  firma  contrato  oneroso,  pelo qual se  obriga  ao  pagamento  das  mensalidades  como  contraprestação  ao  serviço recebido.  O  atraso  no  pagamento  não  autoriza  aplicar-se  ao  aluno  sanções  que  se  consubstanciem  em  descumprimento  do  contrato  por  parte  da  entidade  de ensino  (art.  5° da Lei 9.870/99),  mas  está  a entidade  autorizada  a não renovar  a matrícula,  se  o  atraso  é  superior  a  noventa  dias,  mesmo  que  seja  de  uma mensalidade  apenas” (REsp  nº  660439/RS,  Relª  Minª  Eliana  Calmon,  DJ 27/06/2005);

- “A  regra  dos  arts.  5°  e  6°  da  lei  9.870/99  é  a  de  que  o  inadimplemento  do pagamento  das prestações  escolares  pelos  alunos  não pode  gerar  a aplicação  de  penalidades  pedagógicas,  assim  como  a  suspensão  de  provas  escolares  ou  retenção  de documentos  escolares,  inclusive  para  efeitos  de transferência  a outra instituição  de  ensino.  Entretanto,  no  afã  de  coibir  abusos  e  de  preservar  a viabilidade  financeira  das  instituições  particulares  de  ensino,  a  lei  excluiu  do direito  à  renovação  da  matrícula  (rematrícula),  os  alunos  inadimplentes.  'A negativa  da  instituição  de  ensino  superior  em  renovar  a  matrícula  de  aluno inadimplente,  ao  final  do  período  letivo,  é  expressamente  autorizada  pelos  arts. 5° e 6°, § 1°, da Lei 9.870/99'  (Resp  553216,  Rel. Min. Teori Albino  Zavascki,  DJ de  24/05/2004)” (AgRg  na  MC  nº  9147/SP,  Rel.  Min.  Luiz  Fux,  DJ  de 30/05/2005).



O último julgado que se encontra no STJ é recente e mostra que realmente esse é o caminho. Caso seja útil vejam o inteiro teor clicando aqui recente acórdão STJ.


Com isso, fica claro qual é a ferramente que a instituição pode utilizar. Obviamente, ao lado disso, ela não pode deixar de utilizar uma ferramenta de gestão da inadimplência, sobretudo, com foco no combate ao inadimplemento, evitando a criação de uma cultura acomodada dos alunos. É preciso ter atitude correta, nos termos da lei, mas efetiva atitude para evitar que o inadimplemento traga mais prejuízos do que a questão financeira em si.


Luis Fernando Rabelo Chacon é advogado, com atuação na advocacia e na gestão de instituições do ensino superior.




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